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Nesta página electrónica, encontrará poemas e textos de prosa (embora estes últimos em minoria) que visarão várias temáticas: o amor, a natureza, personalidades históricas, o estado social e político do país, a nostalgia, a tristeza, a ilusão, o bom humor...

quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

Poema nº 320 - O Hino do Mar


O Hino do Mar
(Soneto da autoria de Laurentino Piçarra)


A cada rebentar de uma onda
Sai um verso de paz jazente
E o sopro duma tormenta longa
Esbate-se na praia clemente.

Vejo o mar, o espelho da vida
Já conquistou todo o seu mundo
Antes da rebelião da terra foragida
Que renasceu do abismo profundo.

E eu, o que conquistei pela civilização?
Sou lágrimas de maresia desse mar
Deserdado de sereias e de missão!

Ouço o seu hino diante do céu mudo
Os paredões afinam a sua orquestra
E o areal nos seduz de manto veludo.




Foto da minha autoria


Poema nº 319 - Caverna dos Lamentos


Caverna dos Lamentos 
(Poema livre da autoria de Laurentino Piçarra)


De que valem as palavras
Se não as podes escutar?
Menti-te vários dias
Omiti o teu nome
Porque na realidade do viver
Não te confessaria o verbo
Que tu fazias reflectir em mim.
Fui o túmulo caiado da verdade
E assim vivi
Por entre as rosas
Discretas e belas
Que cresciam no redor
Mas que morriam à sede
Porque não as soube regar
Com o amor que lhes devia.
E quanto à rosa mãe
Que criou um jardim esplêndido
No meu coração,
Desapareceu
Foi levada pelo vento
Ou alguém se assenhoreou dela,
E hoje não vale a pena gritar
A caverna donde me encontro
Apenas devolve os gritos dos lamentos
Em forma de ecos grotescos.




Imagem meramente exemplificativa retirada de: https://ducampeche.com.br/

Poema nº 318 - Sento-me neste anfiteatro


Sento-me neste anfiteatro
(Soneto da autoria de Laurentino Piçarra)


Sento-me neste anfiteatro
Miro o horizonte de sombras
Desapossado do meu olfacto
Da maresia das tuas ondas.

Ouço o chilrear dos pardais
Vejo um cão solitário a passar
Mas é da tua falta que sinto mais
Porque eras a alegoria do meu amar!

Irrompe um assobio pelos arbustos
Talvez o espectáculo vá começar
E tu ali estejas para me encantar.

Mas não, sou eu que me iludo:
Herói de um palco sem elenco
Bastardo abandonado pelo tempo.




Foto da minha autoria

Poema nº 317 - O Desencontro da Luz


O Desencontro da Luz 
(Poema livre da autoria de Laurentino Piçarra)


Corre o tempo
Voltam a baralhar-se as cartas
E o desencontro voltou ao horizonte
Ele é a regra
E tu e eu somos um monte
Solitário e lúgubre
De recordações a prazo!
Voltaremos a ser como crianças
Separadas pelo tempo
Em diferentes escolas da vida
Mas absorvidas pela astúcia
De um futuro insensível
Que não intercede pelo nosso amor!
O xadrez da vida é mesmo assim
Não sou torre nem cavaleiro
Para te ir resgatar, minha rainha,
E construir-te o mais belo palácio!
Mas sou o filho do passado
Que presenciou o teu sol nascente
Que alumia castelos e povoações
Inimagináveis, além do meu tempo!
Que desencontro o meu
Voltar a perder a tua luz para sempre
Espera-me agora o limbo da ingenuidade
E os seus rios privados de memórias!




Imagem meramente exemplificativa retirada de: https://www.picswe.com/pics/love-the-light-9c.html

Poema nº 316 - Bagan, Terra de mil vidas e orações


Bagan, Terra de mil vidas e orações
(Poema livre da autoria de Laurentino Piçarra) 


Bagan
Terra do reencontro espiritual,
Como ousas, na tua plenitude,
Ser guardiã de três mil oratórios?
Não te sei explicar,
Talvez sejas a casa dos deuses,
Ou um sonho criativo de todos nós!
Refugio-me nos limiares da imaginação
Percorro os teus caminhos de terra
Que rasgam a tua idílica floresta
E sinto-me logo abraçado pela tua luz,
Pelo despojamento dos teus monges
Que meditam em templos e pagodes,
Trajados de vermelho,
Com as mãos unidas e levantadas
Em direcção ao céu,
Em jeito de pirâmides de fé!
Nesta introspecção sem preconceitos:
Não me conheço a mim mesmo,
Mas tu já me conheces há muito,
Sabes o que fui na outra vida,
E deste-me o privilégio de te conhecer
Ou de te revisitar,
Se fui príncipe, já não quero voltar a sê-lo,
Quero abraçar a pobreza como Buda,
Tratar os outros como irmãos
E esperar que me supere
Nos méritos da honra e da justiça
Para que deixe o submundo
E atinja junto de ti, Bagan,
Após mil e uma vidas,
O nirvana, o paraíso que procuro
Reflectido nos murais pintados
Nas vozes, introvertidas mas presentes,
Que sentenciam os teus santuários!




Imagem nº 1 - Bagan pertence a Myanmar, país do Sudeste Asiático.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

Poema nº 315 - Lagoa do Fogo



Lagoa do Fogo*
(Soneto da autoria de Laurentino Piçarra)


O nosso amor é uma ilha no oceano
Um vulcão que afronta a indiferença
Diante de um mundo gélido e insano
Que se deixa mergulhar na descrença!

Os nossos corpos são florestas selvagens
Que se abraçam, que se acoplam na lagoa
Onde emerge o fogo, a mãe das linguagens
De um sonho voluptuoso que nos povoa!

Que as aves se transformem em palavras
Espontâneas e dóceis, e que se refugiem
Na nossa paisagem que é o reino delas!

E se o nevoeiro vier carregado de incerteza,
Fingiremos um aparente estado de silêncio
Até que as nuvens nos desnudem a pureza!


*Poema de homenagem à Lagoa do Fogo, Ilha de São Miguel




Magnífica Foto da autoria de Stefan Liebermann sobre a "Lagoa do Fogo" (São Miguel, Açores)

Poema nº 314 - Caras, Corpos e Corações


Caras, Corpos e Corações
(Poema livre da autoria de Laurentino Piçarra)

Desde que me conheço,
Confesso que já idolatrei musas,
Modelos desfilantes do mundo real
Ou meras exibicionistas da esfera virtual!
Sim, rendi-me às suas formas
Aos seus corpos divinais
Em forma de esculturas helénicas
Que adornavam os meus jardins da Babilónia
Irreais, mas encantadores!
Mas depois um sábio disse-me:
Que a perfeição nunca fora boa conselheira
No mundo abstracto do amor:
Ela torna-nos reféns das aparências
Obriga-nos a exigir mais dos outros,
Quando somos nós os iludidos!
Somos aqueles que sonham com pontes
Quando não sabemos cuidar da ruela
Que ali está à nossa frente para nos servir!
Exigentes, falidos emocionalmente,
Mendigos de um colosso feminino,
Penitenciamos emoções inglórias
Porque só nos interessam as caras
E olvidamos os corações!
Mulher gorda ou magra,
Rica ou pobre,
Que interessa isso afinal!
O Sol brilha mais numa mulher
Quando é reflexo do seu sorriso puro,
Do seu coração sincero!
Não sou um profeta do romance
Nem sou servo de Zeus,
Mas aceitemos a imperfeição física
Da mulher doce e carinhosa!
Não haverá por aí muitas
Que nos tratem como príncipes da Pérsia,
Quando somos afinal meros peregrinos
Carentes de estima.
E não nos lamuriemos mais:
Antes isso,
Do que sermos prisioneiros
Das tais que venerávamos
Só pela profunda beldade exterior!
O fogo incauto que deflagra à primeira vista
Irracional e tóxico,
Destrói as florestas sentimentais
Dos seus ingénuos portadores,
E se não formos bombeiros humildes
Nas reflexões ardentes interiores,
Encontraremos apenas cinzas,
Cinzas dum tempo que se perdeu!




Imagem meramente exemplificativa retirada de:

Poema nº 313 - A Mortalha de Saladino


A Mortalha de Saladino
(Soneto da autoria de Laurentino Piçarra)


Cai o dia, adormece o sultão
Engolfado na escuridão lunar
Sonhando com a sua salvação
Depois de uma epopeia singular.

Arquitecto do império da glória 
Aguarda pelo anjo da sua alma
Sente o epílogo da própria história
O derradeiro sopro que tudo acalma!

Magnificente, abdica do seu tesouro
Manda distribuí-lo pelos mais pobres
Porque ele foi rei de feitos, não do ouro!

E na hora do luto, é a sua mortalha desfilante
Que, cravada na lança, é exibida ao exército
Como exemplo da sua liderança gratificante.




Imagem meramente exemplificativa retirada de: https://twitter.com/hashtag/saladin



Nota-Extra: Da mesma forma que elogiamos figuras da Cristandade, também o faremos em relação a personalidades doutras convicções religiosas. Saladino foi Sultão do Egipto, e responsável pela conquista de Jerusalém aos cristãos em 1187. A sua tomada deu-se através de um tratado após um mês ou dois meses de assédio. Saladino poupou a vida dos cristãos residentes (mediante um pagamento de resgate da parte destes) e acabaria, mais tarde, aquando do tratado que colocou fim à Terceira Cruzada, de autorizar a presença das três grandes religiões em Jerusalém. Apesar de ter batalhado contra os cruzados, Saladino respeitava os seus líderes e era conhecido ainda pela sua tolerância, nobreza e cavaleirismo. O episódio da "mortalha" é aparentemente verídico. Já moribundo, Saladino abdicou de todos os bens e do cofre real, mandando distribuir tudo para a caridade. Como um dos últimos pedidos, desejou que a sua mortalha fosse exibida, numa lança, à frente do seu exército, de forma a passar um exemplo de humildade aquando das exéquias.

Poema nº 312 - Alfonsus, "Portugaliae Rex"


Alfonsus, "Portugaliae Rex" 
(Soneto da autoria de Laurentino Piçarra)


Rebatem os sinos do mosteiro
Afonso adere à missão da cruz
Rei que dos céus é mensageiro
Ergue a espada-māe que reluz!

Destemido, vencedor do amanhã
Cavalga pelas aldeias esquecidas
Como uma águia que não se acanha
Quando voa por serras sombrias!

Ao longe, avista a fortaleza inimiga
Benze-se, e discursa aos cavaleiros
Para mais uma abordagem suicida!

A desvantagem lusitana é irrelevante 
Afonso crê nos pergaminhos da glória,
E ordena - "Ao ataque, povo flamejante"!






Poema nº 311 - O Templário de Almourol



O Templário de Almourol 
(Soneto da autoria de Laurentino Piçarra)


Libertem as orações de glória
Do idílico castelo de Almourol
Casa de templários sem memória
De mitos esmorecidos pelo sol.

Outrora, Gualdim na ilha aportava
Ostentando a cruz avermelhada
A razão de ser do manto branco
Que trajara no advento da cruzada!

Desde Ourique até à lendária Terra Santa,
Manejara a fé pelo versículo da espada
Numa destreza que até o mar se agiganta.

E ali estava ele naquela fortaleza do Tejo,
Atento aos intentos dos emires sarracenos,
Disposto a preferir a morte ao sacrilégio.




Imagem meramente exemplificativa retirada de: https://www.pinterest.pt/pin/349380883577146956/ 


Nota-Extra: O castelo de Almourol fica situado numa pequena ilha do rio Tejo. Foi reedificado por Gualdim Pais, templário português que esteve presente nas batalhas de Ourique, no cerco de Lisboa, na conquista de Ascalona (isto já na sua digressão à Terra Santa), na defesa do Principado de Antioquia, e ainda na defesa da praça de Tomar, aquando do seu regresso. Foi responsável pela criação de vários castelos. O seu papel no castelo de Almourol foi relevante. Aqui implementou técnicas da arquitectura levantina. Neste cenário, Gualdim Pais poderá ter sido o templário português com maior carreira e obra feitas. Daí o termos relembrado neste poema.
Este texto não pretende valorizar de, modo nenhum, o fanatismo religioso, mas antes o espírito de aventura e coragem de todos aqueles que, na época medieval, guerreavam heroicamente pelas suas convicções ou por causas patrióticas. Neste blogue, também elogiaremos personalidades de outras religiões que se evidenciaram no mundo. Somos a favor da história, mas seremos sempre também a favor da liberdade e da tolerância no século XXI.